Explicação desnecessária

Normalmente, basta demonstrar num arrazoado alguma citação falsa ou alguma absurdidade primária, para que o público sensato admita a inutilidade de discutir o restante, e deixe o debate para uma próxima oportunidade, onde os argumentos venham escoimados de vícios redibitórios que tornem o seu exame lógico um espetáculo gratuito de masoquismo.

Já demonstrei que o sr. Yago Martins (1) falsificou um dos meus argumentos, atribuindo a mim a afirmação de que na Bíblia inteira não se encontra nenhuma recomendação de buscar a salvação na leitura da própria Bíblia, quando eu disse apenas que semelhante conselho não se encontra nas palavras literais de Jesus ali transcritas; (2) bateu de frente com a própria fé bíblica que finge defender, ao afirmar que ninguém jamais procurou a salvação na leitura da Bíblia, quando Nosso Senhor Jesus Cristo, em João 5:39, acusou os bibliólatras do seu tempo de fazerem exatamente isso.

Não deveria ser nem mesmo possível questionar a inutilidade de discutir com quem falsifica as palavras do adversário, ou de debater cristianismo com um suposto pastor da fé que contesta da maneira mais ostensiva as palavras do próprio Redentor.

Aristóteles já ensinava que o filósofo não deve entrar em discussão com quem não conhece ou não respeita as regras básicas da argumentação e da prova. Mas, uma vez demonstrado que é precisamente esse o caso, a torcida organizada do teologuinho de dois dedos continua exigindo um exame crítico ponto-por-ponto de todos os seus demais argumentos, jurando que a recusa de discutir com adversário tão patentemente ilógico e desonesto é uma abjeta desculpa “ad hominem” para fugir do debate.

De onde vem, sobretudo nas almas cristianíssimas dos súcubos de Lutero e Calvino, a necessidade infinita, a ânsia irrefreável de encontrar nos escritos e aulas do Olavo de Carvalho algum defeito, alguma falha, algum sofisma, algum lapso, alguma prova, enfim, da sua imperfeição humana, como se esta trouxesse consigo a obrigação de dizer algo de falso ou de insensato?

Tão forte e incontrolável é esse anseio, que, ao primeiro sinal de que alguém apontou algum erro, não nos princípios fundamentais e estruturas maiores do seu pensamento filosófico, mas em alguma opinião periférica que o referido autor tenha emitido sobre qualquer assunto que seja, já saem soltando rojões, pulando de alegria como saguis em festa, celebrando a descoberta da tão longamente esperada prova final: “É humano! É humano! É humano!”

Instigados a isso por espíritos sublimes como Julio Soumzero, crêem mesmo que, humilhado o odiento ídolo papista, a Prostituta da Babilônia perderá muito do seu poder hipnótico, anunciando a conversão em massa dos corações e mentes à bibliolatria redentora e o ingresso geral do povão nos templos onde, aos gritos de “Louvor e Glória ao Senhor!” e longe daquele medonho ritual canibalístico dos católicos, todos marcharão para receber na vida eterna o seu prêmio celeste, mastigando um pão e deglutindo um vinho onde Jesus não está senão simbolicamente, metaforicamente, assepticamente ou em espírito, como um gato de carne e osso está nas sílabas da palavra “gato”.